sábado, 28 de setembro de 2013

Retratos Urbanos


Pense no centro de uma cidade de médio porte qualquer, com seus edifícios de pedra cinzenta sujos pela fuligem de seus automotores, concretize agora uma rua estrita com calçadas disformes e imundas.
   Chove. Pequenas Lâminas de água de um milímetro de profundidade se acumulam na calçada. Um homem de terno preto e gravata azul anda apressado enquanto protege sua já denunciada calvície com um jornal do dia, caderno de empregos. Fuma um cigarro barato.
  Fumar na chuva enquanto anda não é uma tarefa que lhe apeteça, deliberadamente ele joga o cigarro em uma das pequenas poças, o filtro bate em uma parte seca e cai de forma inclinada em cima de uma tampa de cerveja esquecida por ali, de modo que o filtro se molha, mas a ponta continua incandescente. O homem se afasta. Uma sirene é ouvida a distância.
  Um garoto de rua ainda pré–pubere  desponta na esquina, havia a pouco roubado a bolsa que jazia despreocupadamente ao lado de uma mulher que comia algo nas mesas da frente de uma confeitaria ali perto, não fora visto, mas era melhor não correr riscos desnecessários.
 A sirene havia parado na porta de um suposto traficante, por ser peixe pequeno tinham mandado apenas duas viaturas e cinco policiais. O garoto continua seu caminho e inadvertidamente pisa em uma bituca ainda acesa de cigarro, preste atenção aos pés do garoto, há uma mancha de carvão circular no calcanhar, as unhas são grandes e sujas, mais dois passos na água e a mancha tinha diminuído, alguns metros seus pés estavam limpos pelas poças e a mancha apagada.
  Os pés andam mais duas quadras e viram a esquerda, param então embaixo de um toldo verde, o chão lá estava seco, o garoto observa policiais batendo na porta em frente ao toldo, uma mão com anel aparece do lado de fora de uma janela, ela porta uma arma.
  A metralhadora dispara, o barulho faz o estômago da criança se retorcer de fome, parece demasiado o som do carrinho da pipoca que ele ia comprar com o dinheiro furtado!
  Um projétil perverso decide conversar com o garoto, ele é atingido na têmpora direita. Cai. Os pés até então secos se molham de um líquido vermelho que se amontoa no chão que momentos antes estava incólume.
  O tempo passa.
   Espere! Ouça, não é o barulho de uma metralhadora onde o garoto tinha caído? Vou olhar mais de perto, não, me engano, é só a barulho de um carrinho de pipoca comandado por um homem calvo embaixo do toldo verde. O pipoqueiro se afasta, acende um cigarro barato.

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